Adérito Lopes

por Sherif Awad

Adérito Lopes

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Sou Adérito Lopes, ator português..

A minha família (que eu tenha conhecimento, pelo menos num passado recente) não tinha qualquer tipo de relação com o teatro, nem com as artes performativas em geral. Dentro das artes, havia apenas alguma ligação à música por parte da família do meu avô materno João António Borges antecessores e sucessores. O meu avô que era um apaixonado por bandas filarmónicas e sinfónicas. Ele, os irmãos e alguns sobrinhos, chegaram a tocar em bandas deste género, o meu filho e seu bisneto, Guilherme Cardoso da Costa Borges Lopes, herdou o gosto musical dedicando-se ao estudo de piano e de cravo.

A minha experiência com a música foi muito fugaz e passageira, com algumas lições de guitarra dedilhada, mas que rapidamente foram deslocadas para a expressão dramática. Não há nada de muito original nisto, ao que parece é uma primeira abordagem recorrente dos meus colegas de profissão da minha geração. 

Vivia numa quinta no Catujal, concelho de Loures, distrito de Lisboa, poucos habitantes ao redor e as minhas tardes eram preenchidas com a minha irmã, Cristina Borges Lopes em improvisações teatrais. Inventávamos um tema e reuníamos os adereços e os figurinos possíveis. Ficávamos sozinhos com a nossa avó materna, Maria José Cardoso que nos ajudava ao final do dia a arrumar as roupas antigas que retirávamos das gavetas e arcas para fazermos o nosso teatro. Quando a nossa mãe, Maria da Graça Lopes, chegava do seu emprego a nossa avó já tinha tudo guardado para que a nossa progenitora não se zangasse. Anos mais tarde estas brincadeiras performativas repetiram-se com o meu filho, desta vez, eu e a minha irmã, portanto sua tia somos dirigidos por ele nestes experimentos cénicos caseiros. E agora é avó dele, a nossa mãe, a matriarca quem guarda as fatiotas no final das apresentações cénicas familiares.

-As minhas grandes referências televisivas na infância e adolescências, também geracionais, para além dos atores e humoristas mais presentes no nosso ecrã como Armando Cortez, Herman José, Nicolau Breyner, Raul Solnado, entre outros como Marina Mota e Carlos Cunha, Rosa do Canto, Fernando Mendes, Miguel Guilherme, Henrique Viana, e muito outros.

A série de culto portuguesa nos anos 80 era Duarte & Companhia, uma comédia policial da autoria de Rogério Ceitil, com as inolvidáveis interpretações dos atores Rui Mendes; António Assunção; Paula Mora; Luís Vicente; António Rocha; Constantino Guimarães; Guilherme Filipe; Frederico Cheong; Alberto Quaresma; Canto e Castro; Ema Paúl; e Fernanda Coimbra.

Havia um grande fenómeno em Portugal na minha infância que vinha do Brasil e se chamava Roque Santeiro, uma telenovela produzida pela Rede Globo, escrita por Dias Gomes e Aguinaldo Silva. Foi dirigida por Gonzaga Blota, Paulo Ubiratan, Marcos Paulo e Jayme Monjardim. 

Com o José Wilker como o protagonista Roque Santeiro; e um elenco composto por nomes como Regina Duarte, em Porcina da Silva (Viúva Porcina); Lima Duarte, em Francisco Teixeira Malta (Sinhozinho Malta); Lucinha Lins, em Mocinha Abelha; e ainda Yoná Magalhães; Fábio Júnior; Ary Fontoura; Eloísa Mafalda; Luiz Armando Queiroz; Rui Resende; Armando Bógus; Cássia Kis Magro; Lídia Brondi; Paulo Gracindo; Nélia Paula; Amparito Hernandez; Lilian Lemmertz; Ewerton de Castro; Cláudio Cavalcanti; Othon Bastos; Oswaldo Loureiro; Elisângela; Dennis Carvalho; Alexandre Frota; João Carlos Barroso; Arnaud Rodrigues; Nelson Dantas; Wanda Kosmo; Maurício do Valle; Ísis de Oliveira; Cláudia Raia; Patrícia Pillar; Maurício Mattar; Cláudia Costa; Dhu Moraes; Ilva Niño; Tony Tornado; Luiz Magnelli; Lícia Magna; Cristina Galvão; Waldyr Sant’anna; Sandro Solviatti; Ana Luiza Folly; Gabriela Bicalho; e Bruno César. Entre muitos outros atores convidados, elenco de apoio e elenco adicional.

Nas escolas, em casa e na rua, brincávamos aos “Roques Santeiros” (personagem interpretada por José Wilker) e “Robertos Matias” (personagem interpretada por Fábio Júnior), isto os rapazes. As raparigas queriam ser “Porcinas” (personagem interpretada pela Regina Duarte) ou “Mocinha Abelha” a personagem interpretada pela atriz Lucinha Lins que a minha irmã tanto adorava imitar. Eu também gostava muito de desempenhar o emblemático personagem do Lima Duarte, o Sinhozinho Malta. Penso que toda a gente gostava, todos aqueles que tinham o instinto da representação. Não havia possibilidade de revermos os episódios, mas ficavam-nos as cenas na cabeça e mais tarde reproduzíamo-las.

Tratava-se de facto de uma novela surpreendente que parou o país entre 1986 e 1988, fenómeno semelhante a este em Portugal, mas ao qual eu não assisti (eu nasci em 1980) foi em 1977 com Gabriela, uma telenovela escrita por Walter George Durst, adaptada do romance Gabriela, Cravo e Canela, de Jorge Amado, e dirigida por Walter Avancini e Gonzaga Blota. Protagonizada por Sônia Braga, com Armando Bogus, José Wilker, Nívea Maria, Fúlvio Stefanini, Dina Sfat, Elizabeth Savalla, Marcos Paulo, Eloísa Mafalda e Paulo Gracindo nos papéis principais.

Em 1988, a minha tia materna, Alda Marina Cardoso Borges Costa (também ela uma motivadora e forte presença no meu percurso, sempre a incentivar-me e a incluir-me nos seus projetos de cariz religioso com jovens, nos quais era mentora) levou-me a mim e à minha irmã ao teatro, ao infelizmente extinto Teatro ABC, no progressivamente negligenciado Parque Mayer. Não tínhamos reserva, os teatros no Parque Mayer ainda estavam todos a funcionar, nós íamos ver a Prova dos Novos, com textos de Henrique Santana, Francisco Nicholson, Augusto Fraga e Nuno Nazareth Fernandes, encenação de Maria Helena Matos. O elenco era composto pela Marina Mota, Carlos Cunha, Vera Mónica, Fernando Mendes, Carlos Ivo, José Raposo, Maria João Abreu, Eva Cristina, Gina Espadinha, Isabel Amaro, Cristina Areia, Rute Correia, Olímpia Portela, Fernando Palaío, Teresa Paula e João Paulo. Não conseguimos! Estava esgotado! Vimos um ano depois na televisão. O Parque Mayer era um mar de gente, havia pipocas e algodão doce, ir ali ao teatro era uma verdadeira festa. Aquele dia foi uma correria, havia duas matinés, todas esgotadas, em todos os quatro teatros do Parque Mayer, Teatro Maria Vitória, Teatro Variedades, Teatro Capitólio e o Teatro ABC onde conseguimos arranjar três bilhetes (para mim, para a minha irmã e para a minha tia que nos levou) nas últimas filas e assistimos à peça Pijama para 6, de Marc Cameletti, encenação de Carlos César, com Octávio Matos, Maria Tavares, Luís Matta, Isabel Damatta, António Semedo e Helena Alvarez. Ainda me lembro da sensação de ver o pano abrir, as luzes a acender, o espetáculo a começar, e de pensar – eu também quero estar ali. Eles (atores e atrizes) estão a divertir-se tanto.

Recordo-me também de uma outra ida ao teatro (com o mesmo grupo, eu, a minha tia e a minha irmã que na altura tinha aulas de teatro no 9º ano de escolaridade lecionadas pela atriz Maria Henrique que integrava este elenco) Quem Muda a Fralda à Menina?, de Francisco Ors, com tradução e encenação de Armando Cortez, cenografia de Octávio Clérigo e interpretações de Manuela Maria, Alexandra Pereira, João Baião, Maria Henrique, Maria Rueff, Armando Cortez  e Luís Esparteiro. Foi em 1991 esta produção de Vasco Morgado levada à cena no Teatro Villaret. Mais um encontro com os atores e magia do teatro, lembro-me da Maria Henrique mostrar à minha irmã e aos colegas dela da turma, o palco e os bastidores do Teatro Villaret, eu ia com eles, claro.

Uma das coisas mais fascinantes desta profissão é eu mais tarde ter-me cruzado profissionalmente com muitos dos nomes que já aqui referi.

Um espetáculo que também esteve sempre esgotado e que não conseguimos arranjar bilhete, acabando por o assistir mais tarde pela televisão, mas que se tornou para mim também uma referência, foi em 1991, Passa Por Mim no Rossio, de Filipe La Féria, com um gigante elenco do Teatro Nacional D. Maria II composto por António Anjos, Catarina Avelar, Curado Ribeiro, Eunice Muñoz, Fernanda Borsatti, Henriqueta Maya, Igor Sampaio, Irene Isidro, João de Carvalho, João Perry, Lurdes Norberto, Madalena Braga, Manuel Coelho, Maria Amélia Matta, Paula Mora, Ruy de Carvalho, São José Lapa e Varela Silva. E ainda com os convidados Rita Ribeiro, Carlos Quintas, José Jorge Duarte, José Simão, Sílvia Brito, Luís Madureira, Ana Luísa Branco, Gaspar Rodrigues, Lucília São Lourenço, Nuno Pólvora, Ana Luísa e Ana Rita, e ainda Simone de Oliveira com a sua memorável abertura. 

Este espetáculo iria dar o mote a outros espetáculos da autoria e direção de Filipe La Féria (com quem já tive o privilégio de trabalhar) que fizeram parte nos meus/nossos serões televisivos no início dos anos 90 do século XX, como Grande Noite, que revelou a todo o país João Baião, neste espetáculo gravado ao vivo e transmitido pela RTP, na altura ainda a nossa única televisão portuguesa.

Em 1996, com 16 anos, começo a frequentar uma oficina de teatro em Lisboa, na Comuna – Teatro de Pesquisa e a ver espetáculos como o (para mim) inesquecível O Mal da Juventude, de Ferdinand Bruckner, encenação João Mota, com Alfredo Brissos, Álvaro Correia, Carla Chambel, Cristina Cavalinhos, Manuel Couto, Sandra Faleiro e Victor Soares. Eram brilhantes as interpretações, eles pareciam fazer aquilo sério, como na vida, mas não era como na vida, era muito mais interessante. Era teatro.

Não há dúvida! Eu não quero estar ali, eu vou estar ali. E vou estar o mais depressa possível.

Adérito Lopes

Durante muitos anos o ensino da profissão de ator em Portugal estava limitado apenas a uma escola, ao Conservatório Nacional, fundado em 1836 (por Almeida Garrett, seu maior fomentador) na Rua dos Caetanos em Lisboa (que se encontra em obras desde 2018 e sem fim à vista). O curso de teatro, ramo atores passa a integrar o Instituto Politécnico de Lisboa, com a Escola Superior de Teatro e Cinema. Tratando-se de um curso superior, só com o ensino médio (secundário) concluído é possível integra-lo. 

A profissão começou a ser mais procurada e com a procura começaram a abrir mais cursos e escolas privadas e públicas em Portugal, com mais predominância em Lisboa, a capital. Cursos direcionados para outras idades, nomeadamente adolescentes, como o atelier/oficina Espaços e Expressões da Comuna-Teatro de Pesquisa que eu frequentei entre 1996 e 1999 dirigido por Alfredo Brissos (ator e encenador); Cecília Sousa (atriz); José Pedro Caiado; Paulo Raposo (antropólogo) e Sandra Machado (atriz). Foram aqui os primeiros experimentos do teatro e dos seus exercícios dirigidos por profissionais.

Em 1998 integro o curso de Interpretação/Teatro, da EPTC – Escola Profissional de Teatro de Cascais, onde foram meus professores Ana Clara Justino; António Marques; Águeda Sena; Carlos Avilez; Carlos Carranca; Clara Joana; Cristina Benedita; Fernando Serafim; Francisco D’Orey; José Manuel Costa Reis; João Vasco; Maria João da Rocha Afonso; Mestre Eugénio Roque; Mestre Georges Stobbaerts; Tito Lívio; entre outros. Passei aqui três intensos anos da minha formação e foi a descoberta do metódo. E foi após concluir esta formação, comecei a exercer profissionalmente a profissão de ator no TEC – Teatro Experimental de Cascais, a convite dos seus diretores Carlos Avilez e João Vasco, estreio-me num espetáculo de Carlos Pessoa, Tríptico TEC, numa coprodução com o Teatro da Garagem, em 2001. Uma bela nostálgica experiencia teatral onde fui tão bem recebido ao teatro profissional e onde dividi o palco com Ana Palma, Fernanda Neves, Flávia Gusmão, João Vasco, Luís Barros, Luíz Rizo, Santos Manuel, Sérgio Silva e Teresa Côrte-Real.

Passei por outras formações dirigidas por Águeda Sena, Alfredo Brissos, Filipe Crawford, Guillermo Heras, João Mota, Natália Luíza e Vladislav Pazi.

Sinto frequentemente necessidade de me renovar e de recomeçar, sempre que faço uma formação sinto-me a renascer.

Trabalhei no teatro em Portugal sob a direção de no Teatro sob a direção de nomes, como: Águeda Sena; Carlos Avilez; Carlos J. Pessoa; Castro Guedes; Elsa Branco; Fernando Jorge Lopes; Filipe La Féria; Guillermo Heras; Hélder Costa; João Lourenço; Joaquim Benite; José Martins; Maria do Céu Guerra; Rita Lello e Rui Luís Brás.

Em 2011 na ESTC – Escola Superior de Teatro e Cinema (antigo Conservatório Nacional), para integrei o mestrado em Teatro/Artes Performativas. As aulas foram dirigidas pelos docentes: Armando Nascimento Rosa; Carlos J. Pessoa; Elsa Braga; Luca Aprea; Maria Repas Gonçalves; Sara Belo; Stephan Jürgens; entre outros.

Conclui em 2018 o doutoramento em Comunicação, Cultura e Artes – Especialização: Teatro, pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – Universidade do Algarve, orientada pela Professora Doutora Adriana Freire Nogueira e Professor Doutor Armando Nascimento Rosa, com a tese: «Uma Interpretação de Pessoa: manual de um ator».

Para mim a formação é importante, é importante aprender e praticar aquilo fazemos com profissionais mais experientes, ou com experiencias diferentes das nossas.

Aquilo que sabemos fazer, muita gente o faz. E dessa muita gente, muitos são aqueles que o sabem fazer melhor que nós. Então, vamos lá aprender mais alguma coisinha.

-Aos poucos os portugueses têm vindo a afirmarem-se pelo mundo. É muito interessante e motivo de orgulho para nós e para o público em geral ver atores e músicos a fazerem sucesso no estrangeiro. 

Eu nunca ambicionei fazer carreira no estrangeiro, apesar das poucas ofertas e da instabilidade da profissão ator em Portugal sempre quis continuar aqui. Sou muito apegado às pessoas e aos lugares. As minhas referências profissionais estão por aqui e pelo Brasil por onde me apresentei diversas vezes em tournées com espetáculos de teatro da companhia de teatro A Barraca com a qual colaboro como ator há mais de uma década. Gosto de ir ao Brasil, gosto do trabalho que se faz por lá, mas também gosto de voltar. A minha família está maioritariamente em Portugal, por isso, por teimosia, por opção, não tenciono mudar de país. Aqui me fizeram, aqui me vão aguentar durante mais uns (espero que) longos anos neste século XXI.

-O meu grande desafio atualmente é o ensino. Uma área que comecei a explorar na década passada depois de concluir o grau mestre e prosseguir para o doutoramento. Lecionar jovens que sentem apetência pela representação em teatro é sem dúvida o meu atual e maior desafio. Sem dúvida um exercício de grande responsabilidade e amor, que me preenche e renova todos os dias.

-O teatro em Portugal é um sobrevivente, um parente pobre. Não tem o apoio das grandes empresas. São poucos os investidores desta área. Assim o teatro tem vindo a transformar-se num hobby, há uma minoria de atores que consegue viver exclusivamente do teatro. Os atores para subsistirem em Portugal desdobram-se em múltiplos trabalhos, umas vezes na sua área, como dobragens, televisão, cinema, publicidade, etc. Outras vezes nem por isso…

Os financiamentos são apenas governamentais, cada vez mais curtos e com critérios discutíveis, não chegam para todos os grupos, acabando por muitos se extinguirem, outros mal chegam a nascer ficando-se pelas primeiras produções.

Os grupos financiados são muito fechados não fazem audições, não estão disponíveis para trabalhar com atores que não conhecem, elencos cada vez mais reduzidos motivado pelo financiamento cada vez menor. Os jovens atores têm uma grande luta para obterem a primeira oportunidade profissional com um grupo veterano, pois quando os grupos fazem a candidatura para o financiamento estadual já têm que apresentar os nomes dos atores nos projetos aos quais estão a pedir apoio. Assim fica muito difícil de começar, e desenvolver uma carreira no teatro em Portugal. Então, para sobreviverem a esta profissão precária os nossos atores que começam pela paixão do teatro, tentam criar os seus próprios projetos, muitas vezes sem usufruírem de qualquer tipo de receita, apenas por amor e teimosia e desenvolvem outras atividades para obterem um rendimento.

-Não me tenho movimentado pelo dinheiro. Tento realizar o máximo de projetos, mas nunca deixei nenhum a meio para investir noutro mais rentável ou mesmo mais interessante. Tenho sido fiel aos meus compromissos profissionais.Prezo a deontologia profissional. Definitivamente, o dinheiro não é tudo.

-Sou Professor Coordenador do curso profissional de Interpretação – Ator/Atriz no IDS – Escola Profissional em Lisboa.Brevemente estarei em cena com Ivanov de Anton Tchekhov, numa encenação de Maria do Céu Guerra.E com mais umas passagens pelo meio audiovisual, através da televisão, cinema, streeming, e a vida.

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Sherif M. Awad
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